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Foto: Reprodução |
"Nós tínhamos feito um álbum de remixes [Army of Me, 2005] para levantar fundos para a UNICEF. Fui convidada para ir até a Indonésia para que, um ano mais tarde, pudesse ver o que tinha sido feito com o dinheiro arrecadado. E essa viagem foi um grande choque para mim. Claro que já tinha visto as imagens na televisão, mas estar lá é outra coisa. Isso sem falar no cheiro da cidade, de ossos. Estive em um vilarejo onde mil pessoas tinham morrido. Os parentes delas continuam lá, as casas foram destruídas, mas ainda dá para ver os quadrados no solo. Na lama, há uma mistura de ossos e objetos, como brinquedos de criança. As pessoas tentam identificar os corpos para enterrar as pessoas e colocá-las em túmulos com lápide, mas muitos abandonaram essa ideia.
Me senti estranha quando saí dali. Compus Earth Intruders quando estava
em um avião voltando da Indonésia, na área do tsunami. Fui direto para uma
sessão em um estúdio com Timbaland. Essa foi a primeira canção em que
trabalhei com ele, as palavras saíram da minha boca rapidamente. Eu estava
tentando dormir naquele assento desconfortável do avião e acabei sonhando com
um "tsunami de pessoas" - milhões e milhões de indivíduos pobres doentes
marchando até a Casa Branca tentando igualar um pouco a estrutura de
poder neste planeta. Parece bastante ingênuo, mas foi assim. Mas não acho que
os humanos sejam realmente seres intrusos. Pouco importa se as religiões
tentam nos separar da natureza, isso nunca funcionará, nós fazemos parte dela.
Depois de um tempo, quis corrigir a letra, mas não consegui, decidi deixar o
turbilhão de emoções. Tinha que ser daquele jeito. Liricamente é provavelmente
a música mais caótica que eu já escrevi, na questão de não fazer muito
sentido. O objetivo é o caos. Eu não queria lógica.
Quanto ao Timbaland, nos conhecíamos já há muito tempo. Ele tinha usado um
sample de Joga dez anos antes, para uma música da
Missy Elliott. Nós somos muito diferentes, mas talvez nos encontremos
em uma ilha comum graças ao interesse pelos ritmos do norte da África e da
Índia. Em dezembro de 2005, liguei para ele e disse: "Acho que está na hora".
Estava pronta para alguma coisa cheia de energia, não sabia como explicar, mas
queria que explodisse. Ele não tinha tido muita visibilidade no ano anterior.
Depois da nossa parceria, ele trabalhou nos álbuns de
Justin Timberlake, Nelly Furtado e em vários outros que chegaram
ao número 1 da parada - e então lhe dei os parabéns. Algumas pessoas chegaram
a me perguntar se tinha entrado em contato com ele por querer ter um hit. Isso
não tem nada a ver. Pelo contrário, eu gosto mais de suas músicas menos
conhecidas que nunca se tornaram singles. Eu não estava tentando ir para o
mainstream. Isso era sobre a música!
Começou a também circular um boato de que eu estava gravando um disco de
hip-hop. Achei bem engraçado. Timbaland é um músico de assinatura muito
forte que vai além disso. Queria trabalhar com ele, não com um gênero musical.
Aliás, eu trabalhei com ele porque queria músicas viscerais, físicas e fortes.
E ele é definitivamente um cara que dá espaço para uma mulher forte, como a
Missy. Ele deixa ela ser quem ela é. Não é como se tivesse que manter a boca
fechada e ser só sexy. Quando você entra no estúdio com ele, é algo como:
"Largue tudo e faça isso em nome da música". Costumo ser muito protetora com
os meus álbuns. Não quero que pareça que simplesmente fui às compras dessas
músicas. O que mais me preocupa é que a colaboração venha de um lugar genuíno,
que é orgânico. Acho que é possível perceber quando as coisas são feitas sem
qualquer química".
Fontes: SPIN, Rolling Stone Brasil, The Guardian.