Em comemoração aos 30 anos de "Birthday", a UNCUT Magazine reuniu depoimentos de colaboradores de Björk
Em agosto, "Birthday", o primeiro single do Sugarcubes, música que impulsionou a carreira de Björk para o mundo, completa 30 anos! Pensando nisso, a Edição de fevereiro de 2017 da UNCUT Magazine reuniu depoimentos de ex-colegas de bandas da islandesa e outros colaboradores, destacando algumas curiosidades sobre o processo criativo da islandesa. Confira:
Siggi Baldursson: "Eu comecei a trabalhar com Björk e o Einar em 1983, em uma banda chamada KUKL. Ela sempre teve uma relação especial com a música dela. E desce cedo já era muito criativa. Tocaria flautas, xilofones e teclados, mas nunca guitarras ou instrumentos com cordas, mas era uma ótima baterista. O ritmo era algo importante para ela. Em 1986, criamos a Smekkleysa (Bad Taste), um encontro musical de vários artistas visuais e escritores. Einar e Björk lançavam alguns livros de poesia e os vendiam em bares. Decidimos que precisávamos de uma banda para ganhar algum dinheiro com o selo, então tivemos esta ideia hilária chamada Sugarcubes. Éramos jovens pseudo punks criando música pop conceitual. Cada um até podia trazer uma ideia para alguma canção nos ensaios, mas nunca uma música inteiramente pronta. Seus colegas tinham que contribuir. Era assim que escrevíamos. (...) Mas depois ficou evidente para todos nós que Björk precisava de outra saída para explorar sua criatividade. Nós até tentamos fazer "Human Behaviour" juntos, mas não deu certo com os nossos instrumentos. Ela era o próprio coletivo dela. Considerando que a banda começou como um casal (Björk e seu ex-marido Þór Eldon, pai de seu primeiro filho), que depois passou por um divórcio, fico surpreso que o grupo tenha durado 6 anos!
Einar Örn Benediktsson: "Começamos brincando, fazendo música pop inimaginável por aí. Não existia hierarquia. Todo mundo participava. Não existia foco na Björk como vocalista, eu também era. Nós não pensávamos naquilo como a música dela. Tínhamos muita química enquanto banda. Éramos fortes e unidos naquilo que fazíamos! Se ninguém estava gostando, então parávamos! Foi tudo muito trabalhoso. Nós fizemos alguns shows, e com o dinheiro começamos a gravar canções para o "Life's To Good". Tínhamos a "One Little Indian Records", uma amiga antiga, então oferecemos nossas 10 músicas, as traduzimos para o inglês em benefício deles para que entendessem sobre o que estávamos cantando, e perguntamos se queriam lançar. Foi basicamente isso. Depois fomos para Londres para a mixagem do álbum, e ficamos em um apartamento, que só tinha um quarto, em Notting Hill. Nós nunca dissemos que a banda acabou, só não voltamos mais para o estúdio. Aquele show de 2006 não foi bem um encontro. Nos divertimos bastante e as músicas ainda eram atuais. Ainda continuamos todos bons amigos, e temos o selo".
Margrét Örnólfsdóttir: "O show tinha hora para acabar. Este era o caso para todos nós. Quando começamos, foi uma aventura, e cheia de muitas risadas. Já perto do fim, sentimos que não estávamos mais nos divertindo tanto assim. Foi uma morte natural. Era uma banda de amigos e agora temos muitas lembranças calorosas".
Graham Massey: "Ela é realmente uma nerd da música! Nós nos conhecemos em Londres, quando o 808 State estava fazendo o "The Word", e ela tocou para nós algumas demos do "Debut", feitas com uma orquestra da Islândia. Parte desse material pode ser ouvido no álbum. (...) Estive nas primeiras gravações, mas algumas coisas mudaram depois que o Nellee Hooper chegou. (...) Ah, e ela sempre tocava "It's Oh So Quiet" para motoristas de táxi. Ela é uma DJ natural (...) Lembro quando compomos "Army of Me". Inicialmente as letras seriam em islandês, mas acabou ficando em inglês mesmo".
Howie B: "Uma noite ela e o Nellee foram ao Milk Bar com um equipamento de gravação, e quando voltaram, me disseram: "Nós gravamos o vocal de "There's More To Life Than This!". Eles fizeram isso no banheiro daquele lugar. Ela tem essa habilidade de juntar pessoas estranhas e fazer com que funcione. (...) Ela chegava e me dizia: "Oh, Howie, eu adoraria ouvir como a minha voz soa em uma caverna". A outra vez foi: "Oh, Howie, eu quero gravar perto do mar". Oh, Deus! Gravar fora do estúdio é muito difícil por causa do vento, mas deu certo (...) Eu tenho um estúdio, em um prédio com escritórios. Sério, ela chegava às 11 da manhã dizendo: "Eu quero cantar!", e eu respondia: "Ok, sente ali em frente ao microfone". E todo o prédio podia ouvi-la. Seis meses depois essa música estava no rádio".
Marius De Vries: "Eu me lembro do dia em que "Venus As A Boy" surgiu. Eu e Björk estávamos em estúdio de manhã na casa do Nellee, depois de uma noite de festa. Eu estava mexendo em alguns arquivos de um outro projeto, que tinha certa influência de Bollywood. O computador travou e os samples ficaram chiando. Eu pedi desculpas, e ela me respondeu: "Fique parado. Não se mexa! Oh, isso é bom!". Foi como se tivesse vindo de uma força divina. (...) Vez ou outra, ela pedia por novos sons da seguinte forma: "Eu quero que soe como o topo macio de um coco" ou "Sabe quando você aperta um tubo de pasta de dente? Tem que ser assim". O melhor de tudo é que eu a entendia! Ela se comunica de uma forma maravilhosa, mas o inglês ainda é sua segunda língua. Por causa de sua dicção, algumas palavras se tornam únicas. Em uma ocasião, questionei a forma como ela cantou parte de uma frase em "Possibly Maybe", dizendo: "Não. Nós não falamos assim", e ela me respondeu: "Bom, eu falo". Ela não quer ser confinada pelas regras da língua. Existe uma inteligência feroz escondida atrás de sua poesia".
Guy Sigsworth: O vocal de "Unravel" é o do primeiro take. Ela tinha acabado de compor a canção, ouviu a gravação, escreveu a melodia e voltou para cantá-la! Esta foi a única vez em que aconteceu isso em tudo o que eu já gravei".
Damian Taylor: "O irmão dela foi nos buscar no aeroporto quando chegamos na Islândia. Ele dirigiu durante horas até chegarmos no meio do nada para gravar "Aurora". Os pés dela na neve acabaram sendo o início da música" (...) Nas gravações do "Volta", nós tínhamos um lugar em que estávamos trabalhando em Nova Iorque. Até que um dia ela veio e me disse: "Acho que vamos para Jamaica amanhã". Então fomos e passamos três semanas lá! (...) Ela gosta de trabalhar das 11 da manhã às 4 da tarde, e por isso teve alguns desencontros com o Timbaland, mas basicamente em um dia ele colocou as batidas e ela disse: "me dê um microfone". Vê-la cantar 5 ideias principais por horas em uma jam nas sessões de "Earth Intruders" foi uma das coisas mais loucas que eu já presenciei na vida! (...) Nas gravações de "Biophilia", o primeiro iPad saiu em 2010, e ela conseguiu pessoas incríveis para nos ajudar. Foi o maior projeto científico de arte que se poderia fazer. Ninguém diria que ele é mais acessível que o "Debut", mas ela tem uma capacidade incrível de transformar sua imaginação em realidade. E se ela canta sobre isso, ela vai tocar as pessoas".
Drew Daniel, Matmos: "Quando fizemos o "Vespertine", foi no tempo em que os laptops estavam começando a ser algo em que as pessoas ouviam músicas. Uma de suas ideias era fazer com que soasse bem neste aparelho. Ela adorava isso de alguém deitar em uma cama, colocar o laptop em cima do estômago e ouvir as canções (...) Ela veio até São Francisco por uma semana para trabalhar conosco. As sugestões que ela deu foram: "faça com que seja triangular, original e cabeludo". Ela não dá a mínima para hits. No primeiro dia, ela veio com um monte de melodias que me tiraram o fôlego! Ela começou a cantar "Pagan Poetry" do meu lado enquanto eu a gravava. Ela só tirou os sapatos e cantou! É um daqueles momentos em que você fica de cabelo em pé!".
SK Shlomo: "Haviam pedido para que ela escrevesse uma música para as Olimpíadas, e então surgiu "Oceania", e ela gravou no piano. Esta canção não faria parte do álbum, mas quando ela estava em Londres mixando o "Medúlla", decidiu incluí-la, o que significa que tivemos que regravá-la, já que todo o álbum tinha sido feito a partir de vocais. Ela me perguntou se eu conseguia fazer os 'instrumentais' como um 'techno rumbo' ou um 'samba industrial'".
Matthew Herbert: "Eu penso constantemente sobre a abordagem dela. O desejo de não ir pelo caminho mais fácil".
ARCA: "Eu fiz um DJ-set na festa do último show de "Biophilia", então rolou um convite para que eu fosse até a Islândia, para ouvir coisas sem expectativas. Eram as canções que entrariam no "Vulnicura", que já tinham sido escritas, com arranjos de cordas e as letras. Eu chorei bastante! Ela não funciona de forma calculada. É movida por um passo de cada vez, ouvindo a intuição. Havia uma sensação de bem-estar durante as gravações, um cuidando do outro. Quando você trabalha com Björk, você entra em uma família".
Bobby Krlic, The Haxan Cloak: "Eu também estava saindo de um relacionamento, e uma vez que ela soube disso, passamos a nos consolar. Tudo o que ela faz é transmitir a emoção. Trabalhar em um registro tão pessoal era importante. Ela queria que todos os envolvidos compreendessem e embarcassem nesta viagem com ela".
Krlic: "Tudo vem de seu cérebro. Ela é surpreendente, e sua música articula-se de uma maneira diferente de qualquer pessoa. Nós estávamos mixando uma canção, e ela disse: "Parece que estamos ao lado do lago ao ar livre, mas eu quero que soe como minha voz em um fogo, de forma aconchegante, e estamos sentados ao lado da lareira". É realmente fácil de interpretar. Você trabalha em um grande nível emocional. A maior parte de "Vulnicura" foi feito em Reykjavik. Nós passaríamos quatro dias mixando, 10 horas por dia, então alguns amigos próximos seriam convidados para o estúdio, nós desligaríamos as luzes e tocaríamos o disco do início ao fim".
Anohni: "Nós tivemos algumas aventuras na Jamaica. É um lugar incrível! Teve uma noite em que a Björk foi nadar no mar. Eu fiquei nervosa! A primeira vez em que estive ao lado dela para cantar, me dei conta do total compromisso de um cantor no estúdio. Ela é tão corajosa! Em "Atom Dance", ela tinha uma melodia e eu improvisei bastante. Foi uma sessão selvagem e eu queria dar o máximo de mim. Ela é uma produtora incrível. Editou tudo sintonizando com este 'som de oráculo desumano'. Sua mente é a de um cientista, bem como a de uma artista. É uma pessoa incrível para se colaborar, pois oferece a seus convidados uma grande liberdade, mas sempre encontrando uma maneira de 'desenhar' o material em seu próprio universo. Ela exerce uma liberdade na abordagem de sua vida que eu acho inspirador. Björk é extremamente bela, forte e muito gentil". ♥
Agradecimentos: Patrick Fontinele, que nos forneceu os scans da matéria.