Index Magazine, Setembro de 2003
Alexander: Eu estive fora a noite passada, então estou meio de ressaca. Acabei de acordar!
Björk: Desculpe.
Alexander: Isso é legal. A primeira pessoa com quem estou falando hoje é a Björk. Então, você está em Bruxelas agora com a sua bebê?
Björk: Sim, então está tudo excelente! Estou tentado ser profissional pois queria escrever coisas para te perguntar, mas não consigo ler o que escrevi! Esta não é exatamente uma pergunta, mas eu sinto que, nos anos 90, nossa geração estava tentando fazer amigos entre a natureza e a tecnologia, mas nossos pais e muitos outros queriam nos fazer acreditar que as duas coisas deveriam ser inimigas.
Alexander: Exatamente.
Björk: Nosso papel foi torná-las amigas. Eu posso ver muito disso em seu trabalho - você tem esse material realmente misturado com a alta tecnologia. Eu faço isso com a música. Com a nossa geração, senti que havia essa esperança de que o mundo inteiro se unisse através disso. Então essa 'guerra' inteira ficou sem sentido. Eu estava pensando sobre como você se sentiu com tudo isso.
Alexander: Eu criei um monte de coleções baseadas no homem e na máquina, no homem e na natureza, mas, em última instância, meu trabalho sempre é direcionado pela natureza de forma que é preciso conectá-lo à Terra. As coisas que são processadas e reprocessadas perdem sua essência.
Björk: Absolutamente.
Alexander: Eu apoio o que você diz sobre essa conexão entre o homem e natureza, mas é como se estivesse falando com uma parede de tijolos quando se trata do resto do mundo. Todo mundo quer uma vida mais fácil. Eu não acho que a natureza se encaixa nos conceitos da maioria das pessoas sobre o que realmente é uma vida mais fácil.
Björk: Quando pensei em você, por algum motivo me lembrei de uma entrevista que li sobre um arquiteto. Ele falou sobre algo que chamou de tirania do inconsciente. Ele acha que existem dois tipos de pessoas criativas - as pessoas que reúnem ideias, e as pessoas que caem em um estado de esquecimento e criam algo baseado no nada. Sua teoria é que as pessoas que colecionam ideias se sentem realmente ameaçadas por aqueles que criam a partir do nada. É o que ele quer dizer com a tirania do inconsciente. Em qual grupo você acha que se encaixa?
Alexander: Eu seria o sonhador. Tiro minhas ideias dos meus sonhos. Isso me faz um tirano?
Björk: Eu achei isso realmente interessante.
Alexander: Se você tem a sorte de usar algo que você vê em um sonho, é puramente original. Não está no mundo que se encontra na sua cabeça. Eu acho que isso é incrível. Talvez eu seja apenas um maldito tirano. Eu gosto disso!
Björk: Este cara parecia estar em uma missão em tirar os sonhadores do planeta. Acredito que ele estava com ciúmes.
Alexander: Eu acho que ele tem um chip no próprio ombro.
Björk: Estou bastante cansada hoje. Fiz um show ontem à noite.
Alexander: E como foi?
Björk: Muito bom! O Radiohead tocou logo depois de mim. Eu nunca tinha visto eles ao vivo. Thom Yorke é simplesmente destemido.
Alexander: Um grupo incrível!
Björk: Se você fizesse música, como acha que seria?
Alexander: Se eu fosse um músico, eu iria procurar por música e instrumentos indígenas e formar uma orquestra - talvez usando alguns tubos de madeira da Amazônia e algumas guitarras da Índia. Eu criaria uma música global que é diferente de qualquer coisa que alguém já ouviu, assim como você faz.
Björk: Seria uma música 'pra cima' ou não?
Alexander: [a minha orquestra] teria que tocar Donna Summer. Eu combinaria as batidas provenientes da Amazônia e das Quatro Estações de Vivaldi da Índia junto a tambores de Nova York. O quão incrível seria isso?
Björk: Parece muito bom!
Alexander: Seria o single mais longo já feito na face da Terra.
Björk: Você realmente já pensou em fazer música?
Alexander: Você não quer me ouvir cantar, mas, sim, eu faço música para os meus eventos. Em qualquer coleção, provavelmente existem mais de trezentos conceitos aos quais estou fazendo referência. Então, para que a música funcione, ela tem que se relacionar com todas elas. Fazemos pesquisas na Internet e recebemos toda essa 'música estranha'. O meu último desfile foi como uma viagem da Tundra da Sibéria ao Japão. Eu usei as pessoas mais expostas na música atualmente - Britney Spears e Christina Aguilera - e as misturei com música indígena. Algo bem lúdico! Foi o meu jeito de explicar que existe vida além de todos esses sons.
Björk: Eu não vi o seu último show. Eu estava no país errado novamente. Eu deveria lhe pedir a filmagem.
Alexander: Eu vou enviar para você.
Björk: Quando eu morava em Londres, você estava fazendo umas oito coleções por ano!
Alexander: 14.
Björk: 14, desculpe. [Risos]
Alexander: Aquele foi um tempo muito traumático na minha vida. A moda é como a indústria da música - a atenção constante acaba criando muita pressão. Quando você está fazendo tanto trabalho, meio que se torna um esquizofrênico.
Björk: É ainda pior, porque pelo menos na indústria da música existe a chance de assinar com uma gravadora. Para os jovens designers, nem sequer algo parecido.
Alexander: Isso é verdade! Quando eu comecei em 92, eu não tinha nada - não havia nada realmente em Londres. Mas foi um bom momento, na verdade, porque as pessoas estavam colaborando. Como não tínhamos dinheiro, nenhuma maneira de produzir coisas - música, moda, arte - todos nós sabíamos que devíamos trabalhar juntos. As pessoas produziriam e a fariam a música do seu show de graça. Hoje, muita gente se tornou egoísta.
Björk: Todo mundo?
Alexander: As grandes gravadoras e também a indústria da moda pensam que ao ganhar muito dinheiro em cima de uma pessoa isso o tornará ótimo, mas não é assim. É necessário uma base sólida para se trabalhar e isso leva tempo!
Björk: A menos que eles acabem trabalhando para os grandes, os jovens designers não têm lugar para ir. É insano!
Alexander: Foi tão difícil para mim! Demorou uns cinco anos até eu realmente ganhar dinheiro. Você faz isso pelo amor ao trabalho. Eu amo moda. Não tanto quanto eu costumava, mas... Eu ainda adoro. Tenho bons dias e dias ruins. Se você tem uma visão e quer realizá-la, é preciso sacrificar algumas coisas na vida.
Björk: Você acha que esse tipo de compromisso é válido para os relacionamentos e que nós como criaturas somos feitos para ser monógamos?
Alexander: Sim, eu realmente acredito nisso. Cisnes fazem isso. Muitos animais são estritamente monogâmicos. As aves migratórias sempre retornam ao mesmo parceiro para se reproduzir. Sempre fui uma pessoa monógama. Eu não tenho tempo e energia para mais de um parceiro. [Risos] Você acredita que devemos ser assim?
Björk: Eu acho que sim.
Alexander: Promiscuidade é parcialmente a responsável pela proliferação do vírus HIV. Eu tenho uma ideia muito idealista sobre o que a minha vida deveria ser. A estrada que escolhi é um caminho limpo da monogamia. Claro, como homem gay, não vai acontecer. [Risos] Estou solteiro por mais de dois anos. Tem alguma sugestão para namorados?