Você tem falado sobre a conversa que você teve com Arca sobre as diferentes gerações de vocês dois. Houve algum momento em que ele te inspirou a buscar algo novo ou redescobrir um material antigo?
Talvez o mais surpreendente foi quando ele trouxe canções antigas minhas, instrumentais dos meus trabalhos que eram os favoritos dele, e nós usamos isso meio que como um ponto de partida. Canções como "Ambergris March". (...) E eu encontrei uma B-Side minha antiga, "Batabid", que também usei como referência.
Em certo momento, eu editei uma antiga mixtape dele e escrevi quatro arranjos de harpa e depois enviei para ele. Naquele momento eu não estava ciente disso, mas eu acho que, provavelmente, acabei escolhendo alguns de seus momentos mais comemorativos e ampliando-os em uma canção sobre um beijo. Então é sobre como se "fogos de artifício" explodissem dentro da boca de pessoas que estavam se beijando pela primeira vez. A magia de quando duas bocas se "conhecem". Essa canção se chama "Arisen My Senses".
"Hejira" e "Don Juan's Reckless Daughter" de Joni Mitchell são inspirações para você. Foi também quando ela começou a se distanciar da órbita da música pop, folk, etc, mergulhando em outros universos musicais. Seria o "Utopia" o início de uma viagem parecida?
Possivelmente depois da jornada narrada em "Vulnicura", em que meus arranjos de cordas e a colaboração com Alejandro (Arca) foram como um pano de fundo para aquela saga de um coração partido, nós procuramos fazer com que dessa vez fosse sobre a música em si. E foi assim em "Arisen My Senses" e "Claimstaker", por exemplo, uma recusa em manter uma narrativa singular, mas sim várias vozes todas iguais. Alguns tipos de músicos presentes em "Utopia", onde nenhuma parte é mais importante do que a outra.
Eu sinto que provavelmente a minha música sempre está se movendo dentro e fora da "órbita pop", nunca se estabeleceu inteiramente nisso, talvez não seja uma coisa nova. Eu realmente amo ouvir música pop. Não tem nada melhor do que uma pura e apaixonante canção de R&B em uma sexta-feira à noite. É a perfeição!
O canto dos pássaros e flautas em "Utopia" me fez pensar sobre Olivier Messiaen. Ele via os pássaros como "Deuses da Música". Como o som deles te inspira?
Obrigada! Enquanto eu componho para os meus álbuns, é como se eu resolvesse o mistério de um assassinato tentando entender o tema. Já este disco é como se fosse um lugar. "Biophilia" foi como uma viagem em uma escola de música e "Vulnicura" foi o processo de cura de uma ferida. E neste, é o jeito mais forte, sonoramente, de fazer com que alguém tenha a sensação de que, chegou a um lugar e que está ouvindo pássaros cantando.
Eu sinto que o título ("Utopia") também tem isso na questão do sonho, mas também em experiências passadas, e eu gosto disso. (...) Mas como eu já disse antes, nunca houve tanta urgência em definir nossa utopia, um manifesto. É a nossa única esperança nestes tempos de crise. Nós temos que insistir no futuro que queremos!
Então tem alguns pássaros no álbum que eu nunca tinha ouvido, e até parece um som techno. E tem também alguns pássaros islandeses, corvos e uma ave chamada "mobelha-grande", que vivem do lado de fora da minha cabana. Eu queria que, de alguma forma, esses pássaros representassem tudo isso, às vezes como o desejo de algo inalcançável e outras como a afirmação de que você tem o que quer. E acho que é um tipo de polarização. A luz e as sombras da Utopia.
Mas eu estou fugindo do assunto. Depois de sair com as garotas flautistas, eu montei uma seção de flautas de 12 peças na Islândia, e nós nos encontramos na minha cabana todas as sextas-feiras por alguns meses para ensaiar e gravar. Nós também cozinhávamos e conversávamos, criaturas tão diferentes, inclusive na idade, e por isso foi tão nutritivo. E o clima era de todo o tipo. Às vezes com Nevasca e outras vezes maravilhoso com pássaros cantando ao redor de nós. Então parecia que tudo pertencia àquele lugar".
Uncut Magazine.
Novembro de 2017.
Entrevista por Stephen Troussé.