Não muito longe de Reykjavík, apenas 40 minutos de carro a oeste, fica o Parque Nacional Þingvellir. Nesta relativamente linda área islandesa, a casa de Björk Guðmundsdóttir traz sua Utopia em cinco janelas que vão do chão ao teto, e que também conta com um terraço de madeira. A cabana foi construída em 1965. A residência tem dois quartos, uma grande sala de estar e uma cozinha fofa. Nada de especial. Nada distrai da visão da paisagem. E nada sugere que uma das maiores artistas do nosso tempo vive ali. Talvez tenha que ser assim.
"O lugar não é o meu paraíso", descreve Björk.
O lugar (físico) não é importante se você estiver procurando sua utopia.
Na verdade, queríamos ligar para Björk. Mas alguns minutos antes de nossa conversa, ela cancelou, pois teve uma noite ruim e queria poupar sua voz. Disse que ficaria feliz em responder as perguntas por escrito. A decepção sobre isso mudou rapidamente quando percebemos que Björk responde as nossas perguntas de forma mais livre e precisa do que seria possível se oralmente.
- O "clube das sextas-feiras" formado por ela e pelas 12 flautistas irlandesas: "Foi um bom trabalho para ajustar tudo e mudar timbres para que tivéssemos um alcance de tons vocais mais amplo possível em todas as 13 músicas".
- O coral de "Body Memory": "Eu fiz parte desse coral quando era adolescente. Você pode ouvi-lo nesta canção juntamente com pássaros islandeses, outros sons da natureza, incluindo o vento. Deve ser visto como a utopia de um homem, como se ele já estivesse morando nela - e a música seria o seu hino nacional".
- O novo deve ser baseado em uma urgência: Björk teve longas conversa com Anohni, e segundo ela, ambas compartilham da visão de que a maneira como as pessoas lidam com o meio ambiente se reflete em como a sociedade trata as mulheres. Ela está convencida de que a utopia "é uma necessidade absoluta, especialmente no que diz respeito a questões ambientais, como inventar e usar tecnologias para purificar nossos oceanos, que estão cheios de plástico; Introduzir energia verde! De muitas maneiras, meu álbum é, por assim dizer, uma declaração não violenta e matriarcal. Porque a poluição é uma força dirigida contra todos nós.
(...) Eu sinto que um capítulo dramático terminou. Agora é a hora de abrir um novo. Quando alguém começa outra vez, uma espécie de manifesto é indispensável para formular uma utopia. Para mim, este é um lugar onde você pode ouvir uma música, cozinhar algo para um ente querido e transformar tudo negativo em algo positivo".
- O lado político de sua música: "Como uma artista de música pop, tenho a sensação de que políticas pessoais e políticas públicas muitas vezes coincidem. É por isso que a música pop é uma forma de arte tão emocionante para se expressar, pois simplifica de uma maneira boa e dá mais peso a algumas coisas. A vida cotidiana muitas vezes pode ser caótica e a clareza de uma música é tão útil!".
Ela nunca leu o relato possivelmente fictício de uma ilha criado pelo filósofo Thomas More, a quem devemos o conceito de utopia na sua forma atual. E sobre uma famosa fala do político e ex-chanceler da Alemanha, Helmut Schmidt - que recomendou que quem tem visões, deve "ir ao médico" - ela prefere não dizer nada. A política não é sua profissão e, em caso de se afirmar isso, apenas a política de seu corpo.
"O álbum "Utopia" foi escrito do ponto de vista de ter alcançado esse local desejado. Eu descrevo plantas, pássaros e outros sons que ninguém ouviu antes. Eu achei isso empolgante! A idéia é que o apocalipse já ocorreu. E cabe a nós transformar os restos em algo novo. Limpar. Mudar o curso. Deixar a natureza e a tecnologia trabalharem de mãos dadas".
Entrevista de Björk ao site musikexpress, Dezembro de 2017.