Quando questionada de onde vem sua inspiração, Björk respondeu ao site Visir:
"As fases da vida são tão diferentes! Somos tão diferentes a cada momento. Por exemplo, algo que funcionou há três anos não funciona mais para você. Estamos sempre crescendo e mudando. A estagnação não é uma opção. Normalmente, é acompanhada de muito desconforto. Eu posso naturalmente responder a essa pergunta de várias maneiras, realmente depende do dia".
O interesse de Björk pela música surgiu ainda jovem, e ela esteve em bandas até os 27 anos:
"Então, meu primeiro álbum saiu realmente um pouco tarde, para artistas solo. As pessoas costumam lançar seu primeiro álbum por volta dos vinte anos ou até antes. Naturalmente, eu estive primeiro em uma escola de música por dez anos, o que é muito tempo, de cinco a quinze. Então eu estava em bandas desde os doze ou treze anos.
Naquela época, eu costumava estar com crianças muito mais velhas e meio que [escondida] nas cadeiras ao fundo [da sala]. Naturalmente, para mim foi apenas como estar em quatro universidades. Aprendi muito com todos os meus colegas".
Ela diz que muitas coisas são aprendidas em tanto tempo:
"Como posso explicar isso sem soar como "uma bosta de autoajuda da Nova Era?" A gente aprende que se há uma herança em determinado lado, devemos cuidar disso, e se há algo no outro canto, temos que cuidar também. É importante que tudo isso seja holístico. Por exemplo, se alguma composição vem de um certo ângulo para este álbum, pode ter certeza que haverá um ângulo diferente no próximo. Naturalmente, a vida é de tal forma que não é isenta de problemas. Depois é uma questão de crescer junto disso".
Björk se sente muito sortuda por não ter lançado um álbum solo até os 27 anos de idade: "Eu nunca quis ser cantora e era muito introvertida quando criança. No começo, eu ia ser baterista. Por isso, nunca sonhei com a fama, pelo contrário, prefiro evitar os holofotes. Quando eu tinha 11 anos, um álbum meu foi lançado. De certa forma, foi uma experiência muito devastadora para mim. Então voltei para o fundo, para fora dos holofotes".
Ao longo de sua vida, Björk desenvolveu um "santuário" dentro de si:
"Meu lugar preferido é onde comecei a fazer música, durante as minhas caminhadas. Não foi para os outros. Sempre caminhei de Fossvoginum até a escola dos oito aos doze anos. Esse é o período de que mais me lembro, porque era uma caminhada de 40 minutos para a escola. De ida e volta em todos os tipos de clima.
Então eu comecei a cantar para mim mesma só para me acalmar, e nunca foi algo que eu quis compartilhar com os outros. Então vem de um lugar que é apenas uma parte de mim, como comer, dormir e nadar. Minha conversa com a música faz parte disso".
Björk diz que levou muitos anos para criar esse espaço de segurança:
"Se me sinto mal, posso entrar neste ambiente, e então me sinto melhor. É apenas uma parte de mim. Fiquei dez anos em bandas. Não estava cantando sobre mim, estava apenas nos grupos. Não comecei a cantar sozinha até os 27 anos. Então esse espaço foi tomando forma.
Quando recebi muita atenção global, basicamente recriei esse espaço por vinte anos e tive a sorte de não estar no centro das atenções o tempo todo. Quando eu estava no Sugarcubes, eu só tinha um filho pequeno. Ficava, principalmente, em alguns parquinhos e jogando Lego".
Até hoje, ela demonstra gratidão pelos amigos do grupo e o selo que ainda mantém juntos: "Eles eram todos um pouco mais velhos do que eu, então eu estava muito protegida".
Uma experiência musical 3D:
Björk irá fazer três shows em Laugardalshöllinn nos dias 7, 10 e 13 de junho de 2023.
Ela já pensava em diferentes tipos de som em 2011, durante "Biophilia": "Esse quebra-cabeça [do "som em 3D"] começou desde então, e estávamos fazendo oficinas em várias escolas. Fomos a dez países [com aquele projeto]! Demos livre acesso a todas as escolas, que levaram as crianças até nós. Era melhor quando cada uma tinha um tablet e fones de ouvido".
A própria Björk esteve em uma escola de música na infância, e diz que teve dificuldade em escrever canções em aulas em grupo: "Eu era um pouco introvertida quando criança. Então, achei incrível que todos pudessem aprender teoria musical juntos, mas depois colocassem seus fones de ouvido, escrevessem uma canção. Portanto, era algo realmente projetado para introvertidos ou esse tipo de contato individual".
Realidade virtual:
Quando Björk lançou "Vulnicura", ela criou um ambiente ao seu redor com pessoas usando óculos de realidade virtual.
"O assunto era muito emocionante, um álbum sobre coração partido", ela explica, acrescentando que as pessoas experimentaram grandes sensações quando colocaram os equipamentos1, porque foi uma experiência muito solitária: "Emocionalmente, eu pensei que era um bom ajuste. Há muito isolamento que vem com um coração partido, então foi ótimo para esse tipo de ópera".
A partir disso, Björk e sua equipe começaram a trabalhar com sete equipes diferentes:
"Naquela época, a realidade virtual estava em um estágio em que havia sete aplicativos diferentes e sete empresas diferentes, todas competindo entre si. Então começaram a pensar em quem usaria os primeiros óculos de realidade virtual.
Levamos a exposição, "Björk Digital", para vinte cidades e então começamos com sete tipos de óculos, onde cada par tinha uma determinada camada. Fizemos um álbum [visual] em cima disso, e deu muito trabalho. Mixamos na Islândia com Mandy Parnell. Sempre tentei trazer esses especialistas para casa, para que eles também pudessem conhecer os islandeses e aprender com eles".
O próximo passo foi inventar um programa que pudesse mixar som em 360 graus, e Björk diz que todas as sete empresas diferentes, Amazon, Google, Apple e outras, não queriam usar o mesmo software.
"Talvez porque eu não esteja nisso para ganhar dinheiro, eu podia dizer a eles: "Vamos lá, vocês podem colaborar juntos!". Então, finalmente, eles concordaram com isso. Nós escrevemos em equipe e criamos um programa de 360 graus, um dos primeiros para mixagem desse tipo de áudio.
Então lançamos, pudemos colocar tudo em um par de óculos e vendê-lo como um único "videogame", onde as pessoas podem ir para casa e assistir às sete faixas em vídeo. Se tornou uma experiência individual novamente".
O mundo digital transferido para o mundo real:
"Nós queríamos tirar tudo isso daquela experiência individual, daquele ambiente nerd que era mais adequado para uma aula escolar, um álbum de desgosto ou estudantes tímidos introvertidos estudando teoria musical.
Eu queria incluir também a outra escala emocional, que é essa celebração, alegria, festa e algo para todos. Uma energia extrovertida. Utopia. Juntei tudo e aí veio o álbum "Utopia". O nome explica o tema daquele disco. É mais como uma "receita" para o paraíso do que exatamente um paraíso. Era sobre todos no futuro viverem em uma "ilha nas nuvens", onde sempre há flores e todos são amigos. Mas eu tinha muita consciência de que era um sonho impossível, por isso chamei de "Utopia"".
Björk também tinha um manifesto em mente:
"Eu tenho um manifesto no show! Também conseguimos que Greta Thunberg gravasse uma mensagem no início de 2019. Recentemente, assistimos novamente para ver se deveríamos mudar, mas não, ainda é absolutamente relevante!".
Uma festa artística para os sentidos: O concerto "Cornucopia" é uma festa para os olhos, ouvidos e outros sentidos, pois o público estará rodeado por dezenas de telas interativas com instrumentistas, coros, flautas, clarinetes, percussão e inúmeros instrumentos feitos sob medida.
"Perdoe-me por me gabar, mas recebemos críticas astronomicamente boas para o show em Nova York. Eu realmente não entendi por que no começo, mas estávamos trabalhando nisso há três anos. Pode-se dizer que esse concerto é o melhor do que tenho feito nos últimos quinze anos, tirado da realidade virtual e colocado no palco".
Colaboração Islandesa:
Björk trabalhou com vários músicos nos últimos anos, mas no álbum "Fossora" podemos encontrar, entre outras coisas, uma colaboração com o grupo islandês sideproject, em "Ovule":
"Naturalmente, eu mesma escuto as músicas deles! Acho muito agradável. Quando se está fazendo algo por tanto tempo, aprendemos muito".
Björk diz que é importante trabalhar com músicos que ouvimos e gostamos, senão a colaboração provavelmente não vai dar certo:
"O tempo trabalha com a gente nesse aspecto aqui. É uma boa lição trabalhar naquilo que estamos interessados, fazendo aquilo que admiramos.
Acho que o sideproject é simplesmente incrível. Também tenho muito respeito pelo selo que eles fazem parte. Ninguém está fazendo isso por dinheiro! É mais o espírito e o idealismo que importam do que um tipo específico de música. Isso é sustentabilidade, onde todos estão ajudando uns aos outros [na cena]".
Geeks Techno:
Os caminhos de Björk e dos membros do sideproject se encontraram durante o lockdown:
"Eles são amigos da minha filha, então estávamos acidentalmente na mesma bolha de amigos, então tudo se desenvolveu muito naturalmente e nunca houve um plano. Alguns deles também trabalham na loja do selo Smekkleysa, e sempre fazíamos DJsets lá durante a lua cheia. Todos nós fazemos isso de graça para aumentar a conscientização sobre a música islandesa. As lojas de discos não são necessariamente o lugar mais lucrativo do mundo no momento, então estávamos todos no mesmo time".
De acordo com Björk, todos esses músicos têm uma coisa em comum: são "geeks do techno":
"Eu amo todas as músicas! Música clássica, clássicos contemporâneos, também ouço muito R&B. Adoro música folk e World Music! Mas eu sempre fui uma velha nerd do techno. Por volta de 1989, fui à minha primeira rave em Manchester. Naturalmente, esses jovens são da geração Z. Embora haja uma lacuna entre gerações, o techno não vai a lugar nenhum. Você pode tirar a garota do techno, mas não o techno da garota", diz Björk com uma risada e acrescenta: "Serei uma velhinha de 90 anos ouvindo techno".
A Islândia sempre fez parte da formação artística de Björk:
"Quando eu morava em Londres, era sempre mais como uma segunda casa. Quando eu tinha uma segunda casa em Nova York, sempre ficava mais aqui na Islândia. Sempre fui cidadã islandesa, paguei impostos aqui e isso sempre foi muito claro para mim. Posso dizer que todos os meus álbuns são islandeses, apenas diferentes lados de mim".
No entanto, pode-se dizer que a ligação com a Islândia tem sido ainda mais forte ultimamente:
'O inusitado no álbum "Fossora" é que vendi minha casa no Brooklyn, então é a primeira vez que não tenho casa no exterior. Foi um certo processo e naturalmente apenas uma coincidência que isso aconteceu durante o lockdown, quando não podíamos viajar.
Por exemplo, havia alguns parceiros com quem conversei com os quais poderia ter trabalhado se não fosse pela Covid. Eles possivelmente viriam aqui ou eu iria até eles. Então trabalhei com mais islandeses, talvez por isso.
Eu realmente não sei, porque muitas vezes na primeira metade dos meus álbuns, nos primeiros dois anos, eu trabalho muito sozinha, escrevendo as letras, fazendo os arranjos e cantando. Portanto, muitas vezes é apenas no último ano que convido outras pessoas.
Se eu estivesse em algum outro lugar do mundo, poderia ter convidado mais estrangeiros, mas é claro que realmente não sei [o que poderia ter acontecido]. Metade do álbum era um pouco pesado e já com os clarinetes, e então comecei a fazer os concertos "Orkestral" na Islândia, com todos os músicos com quem já colaborei no país.
Metade do disco é um pouco sobre celebrar essas pessoas. Um pouco de flauta, um pouco de trombone, um pouco de coro e um pouco de cordas. Originalmente não era para ser assim, mas isso ocupou muito espaço em mim, porque eu estava lidando com todos os ensaios e encontrando com essas pessoas".
Aqueles shows também se tornaram uma grande gratidão à Islândia, por criar raízes aqui. É muito importante!".
Ela também diz que vê uma grande diferença entre trabalhar com pessoas em casa e no exterior:
"Os flautistas e clarinetistas, por exemplo, vinham à minha casa às sextas-feiras. Eu sempre podia ouvi-los tocar, talvez mudar uma oitava e liderar o beat. Então, todos nós fizemos isso juntos. É um pouco assim na Islândia, não há líder".
Björk dirige as gravações, mas conta que às vezes conseguiu ficar com os instrumentistas até que eles pudessem se olhar nos olhos e fazer sozinhos: "É algo que eu nunca poderia fazer fora do país, por exemplo".
Certa vez, ela planejou gravar uma faixa ("Pneumonia") para o álbum "Volta", em Nova York, com um grupo de elite de músicos de sopro. Ela já havia gravado todo o resto do álbum em casa, na Islândia.
"Estávamos no estúdio e os instrumentistas pegaram todas as notas. Então dez dos melhores trompistas da cidade de Nova York olharam para mim e perguntaram quem iria reger, já que não havia maestro.
Quando perguntei se precisavam, olharam para mim como se eu fosse uma idiota. Então percebi que não poderia fazer isso como faço na Islândia".
Björk diz que felizmente ouviu falar de seu amigo Nico Muhly, que então foi o condutor dessa gravação.
"Ele recebeu o crédito por todos os metais do álbum, porque ele veio uma vez ao estúdio e regeu. Algo que não partiu dele, mas do jornalismo preguiçoso por aí, que depois corrigimos. Só porque havia um homem na sala, esperava-se que ele fizesse a coisa toda. A história se tornou completamente diferente agora, isso foi em 2007".
Mudança importante:
Durante a entrevista, Björk foi questionada se ela mesma experimentou uma mudança positiva como musicista na indústria nos últimos anos:
"Sim, uma grande mudança. Eu não posso nem começar a descrevê-la. Por um lado, há mais jornalistas mulheres. Nas décadas de 1970 e 1980, por exemplo, praticamente não havia mulheres jornalistas musicais. Você abria uma revista de música, 90% delas eram sobre rock e só cobriam artistas homens".
Naquela época, as mulheres eram levadas menos a sério e Björk leva como exemplo Kate Bush, cuja música "Running Up That Hill", de 1985, chegou ao topo do Spotify no ano passado após estar na série "Stranger Things" da Netflix.
"Eu acho tão bonito que agora ela está recebendo tudo isso! Ela foi retratada como louca e histérica, uma louca do campo que cantava sobre sentimentos.
Mas estava tudo bem estar em uma banda de rock e fazer uma música sobre seios, heroína e cerveja. Mas falar sobre sentimentos, ter filhos e outras coisas assim, era um assunto considerado de terceira categoria.
Portanto, esta revolução está naturalmente em todos os lugares. Certos livros que eram chamados de "livros de mulher", por exemplo: isso tinha uma conotação muito negativa, mas agora a revolução está em todo lugar".
A importância de se gabar:
Björk começou a falar mais sobre seu trabalho.
"Acho que fui um pouco cúmplice, sou dessa geração. Eu ocupava bastante espaço como cantora, mas se eu, por exemplo, fizesse arranjos de cordas em alguma coisa, não falava sobre isso.
Assim as pessoas podem não saber! Meu agente e familiares próximos pensaram que outra pessoa havia feito, e em parte porque talvez eu não estivesse falando sobre isso.
Tenho lutado nos últimos dez anos para me gabar das coisas. Não é completamente natural para mim, mas acho que estou fazendo isso pela minha filha e por todas as meninas".
Como resultado, as coisas mudaram.
"As pessoas agora sabem que fiz a maioria dos meus arranjos e tento lembrá-los disso".
Foto: Santiago Felipe.