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As descobertas de Björk com o álbum Fossora

Björk retornou para a Islândia, criou raízes lá, sobreviveu à perda da mãe e se tornou avó. O resultado de todos esses eventos aparece entre os assuntos abordados em "Fossora". "Eu só queria pousar na terra e cavar o mais fundo no chão com meus pés", explica a artista em entrevista para a revista Uncut. Confira a tradução do bate-papo:

"O principal problema para quem quer dominar as trilhas islandesas é o clima", sorri Björk, falando sobre os prazeres de caminhar em sua terra natal. "Aquele que planeja uma longa viagem deve ter a mente de um atleta. Ou você se torna alguém com presença contínua em um cassino de Las Vegas ou um meteorologista islandês. A propósito, um alpinista famoso morreu aqui recentemente. Ele conquistou a Antártida e o Pólo Norte e depois foi para as terras altas da Islândia. Ele verificou as previsões e se preparou bem, mas o tempo literalmente enlouqueceu".

Não é fácil transcrever o encantamento e prazer das palavras de Björk. Seu novo disco é aventureiro, deslumbrante e, sim, tão chamativo quanto todos os outros da carreira. Ela tem determinado seu próprio caminho desde a infância.

Uma foto engraçada de uma artista de 17 anos (que parecia ter 12) no primeiro estúdio de tatuagem na Islândia, em 1982, está circulando na Internet. Ela e sua amiga Didda aparecem fazendo a mesma tatuagem. O símbolo escolhido foi o Vegvisir, a "bússola rúnica", que é como um "cajado mágico" que ajudava os marinheiros islandeses a encontrar o caminho de casa. "Isso é para não se perder!", explicou Björk, "se os vikings encontrassem mau tempo ou caíssem no nevoeiro, eles desenhavam com carvão na testa. Achei que minha testa era demais para mim, então a enfiei no braço". Quando essa foto foi tirada, ela havia acabado de se juntar à banda Tappi Tíkarrass.

Naquela época, ela estava apenas começando sua jornada intergaláctica: da cena punk islandesa e dos palcos mundiais com The Sugarcubes, aos mares inexplorados e às alturas cósmicas da música pop de vanguarda, tão rica em seu peculiar repertório solo. Mas hoje, indo do céu ao inferno nos cantos enevoados do universo musical, Björk encontrou conforto em casa. A quarentena permitiu que ela aproveitasse sua estadia mais longa na Islândia em décadas. "Estou satisfeita!", ela diz. Seu alegre sotaque islandês ainda irradia a energia do entusiasmo juvenil. "Meus sonhos se tornaram realidade. Pensei: "meu Deus! É assim que meu corpo deve se sentir sem estar sob o estresse constante de voar de avião pelo mundo". Finalmente guardei minhas malas no sótão! Anteriormente, elas sempre ficavam abertas, prontas para a próxima jornada".

"Acho que o mundo inteiro passou por isso? Todas as 7 bilhões de pessoas?", ela se pergunta, falando sobre a pandemia. "A gente teve que criar raízes e nos contentar com nosso círculo íntimo. É assim que se começa a apreciar o que tem, tipo: "Por que ir a Paris? Temos também um café maravilhoso a uma curta distância daqui". Meus amigos são incríveis! Posso me divertir com eles em vez de voar para Tóquio".

Trabalhando em casa, ela desenvolveu seu ritmo de vida tranquilo, o que se tornou uma inovação para ela. "Como a maioria das pessoas, tentei tirar proveito do período de isolamento. É claro que tive que enfrentar os lados negativos da pandemia, mas por que não aproveitar os positivos? Eu tenho uma tendência de colocar muito no meu "prato". Para mim, a parte boa foi que então eu tentei colocar apenas metade nele. Quando eu estava gravando, eu só me permitia trabalhar se eu realmente quisesse fazer isso ou se a música tivesse ideias exuberantes. Não por força de vontade ou trabalhar, tipo: "vai, vai, vai!". Essa pessoa, essa parte de mim, estava trancada na [quarentena] do Covid".

Björk caminhou pelas ruas de Reykjavik. "Sabe, mas, para mim, se trata apenas de sair para andar. Não ando rápido e não tenho nenhum equipamento especializado comigo na hora, visto minhas roupas habituais. Eu tento caminhar todos os dias. Certa vez, li um artigo sobre os benefícios da caminhada: por meio de imagens cerebrais, os cientistas descobriram que caminhar é a melhor maneira de equilibrar seu estado emocional no nível da bioquímica corporal. Após 40 minutos dessa caminhada, o corpo encontra equilíbrio e você é visitado pelo êxtase!". A maneira como Björk pronuncia a palavra "êxtase" provoca arrepios em seu corpo. "E você diz para si mesmo: "Oh! Minha vida brilhou novamente". E você sabe que é verdade!".

Graças a restrições relativamente leves em reação a situação do coronavírus na Islândia, as lojas e cafés locais não fecharam e as reuniões foram permitidas no número de 10 pessoas. Para Björk, a pandemia não se tornou uma fonte de estresse do trabalho ou estudo remoto, mas o contrário, porque isso lhe deu espaço para retornar a uma espécie de vida rural comum. "Eu estava profundamente imersa em tudo, me senti no chão e envolvida. Eu moro no oeste de Reykjavik, e 10 dos meus amigos de infância moram na mesma rua. É como se estivéssemos em uma aldeia. Nossa área tem uma piscina, um café e uma mercearia. Você anda por aí, encontra amigos, fica bêbado em um restaurante, volta para casa. Até organizei umas discotecas na minha casa. Eu não tenho uma disco ball, mas tenho uns alto-falantes muito poderosos! Bebíamos por volta das 18h, depois caminhávamos até minha casa, dançávamos das 8 às 10, depois cada um ia embora, e às 11h30 todos já estavam na cama. Era perfeito!", diz ela com prazer indisfarçável.

Esse foi um terreno muito fértil para o novo álbum. É um disco que ajuda o ouvinte a organizar seus pensamentos, na ideia de que decidiu largar tudo e deixar a cidade. Falando das canções, ela relembrou uma conversa que teve há alguns anos com Þorgerður Ingólfsdóttir, a maestrina do coral que aparece em uma das faixas. "Nos anos 70, na era dos hippies, a narrativa de retorno à natureza era popular, muito significativa para a civilização ocidental. As pessoas saíam das áreas metropolitanas para tocar música na natureza com coroas de flores na cabeça. Eu não estou julgando - tudo parecia muito bonito. Mas na Islândia, a natureza não é sentimental. Ela é muito, muito perigosa! Muito intensa, selvagem e exuberante! Eu gosto de dizer que não é a "volta à natureza", mas sim estar "em frente à natureza".

Se "Fossora" fala sobre o rápido movimento em direção à natureza, então esta é a natureza muito moderna, tão imprevisível quanto a crosta terrestre da Islândia. Os beats caseiros de Björk parecem estar sujeitos a atividade sísmica. "Quando eu os enviei para meus colegas, eles não conseguiam acompanhá-los. Ninguém conseguia. Meus ritmos vem do nada!", e os clarinetes no single principal "Atopos" são uma dissonância turbulenta, sob a qual os Mumins poderiam muito bem dançar em uma rave.

"Sempre tenho playlists das músicas que escuto e das músicas que toco em DJsets. Estou sempre online e sempre baixando alguma coisa. Ainda sou uma nerd musical. Se eu não escrevesse canções, seria como uma versão islandesa de John Peel e compartilharia todas as minhas descobertas no rádio". O que ela costuma tocar em suas discotecas? "Ah, todo tipo de coisa. Existem milhares de gêneros musicais nas minhas playlists! Normalmente tenho tudo separado por estações, mas algumas músicas vagam da playlist de verão para o outono, e depois para o inverno, e aí percebo que a música não sai do rodízio há anos".

Quais são as músicas mais tocadas? "Bom, eu amo pop "de açúcar". Mas eu escuto muito – provavelmente o termo errado – música étnica. Eu gosto de uma música (do cantor do Kuwait) Meshari Al-Arad. Ele morreu em 2018, tinha apenas 35 anos. Estava andando pela rua e foi atropelado por um carro. Fez música no GarageBand e foi um ícone do underground em muitos países muçulmanos".

A abordagem internacional de Björk para fazer música está evidente em "Fossora", que contou com residentes de Nova York e indonésios.

Sobre Kasimyn do Gabber Modus Operandi, ela disse: "Nossa primeira videochamada foi muito engraçada. Eu sei 80% de inglês e eles... bom, talvez 60%? Então escolhi a linguagem das metáforas musicais. "Álbum anterior: sem baixo, sintetizadores, flautas, uma ilha nas nuvens. Novo álbum: seis clarones, escavações, socos no estômago de dinossauros... Você entende o significado?", ela lembra.

Encontrar uma linguagem comum com as pessoas é o superpoder de Björk, que lhe permite colaborar com um grande número de artistas de diferentes caminhos e gerações.

Meredith Monk, a artista de vanguarda de Nova York cujo "Dolmen Music" marcou Björk quando adolescente, ouviu pela primeira vez a islandesa em um cover de sua música, "Gotham Lullaby". "Uma aluna compartilhou comigo um link para um cover de Björk. Fiquei impressionada com a precisão com que ela conseguiu transmitir a atmosfera da música sem violar sua integridade e estrutura. Ela não tentou me imitar. Eu costumo ouvir dois extremos: as pessoas ou repetem tudo exatamente sem improvisação, ou não conseguem pegar a melodia, apresentando tudo de forma livre, o que é igualmente terrível. Björk conseguiu manter o espírito da composição de acordo com os instrumentos que a acompanhavam. Para transmitir o clima, mas à sua maneira, no seu próprio caminho. Quando nos conhecemos, descobrimos que temos muito em comum: curiosidade, autoatividade, xamanismo. Gravamos vários duetos que não vejo a hora de terminar. Nós temos um relacionamento de irmãs realmente cheio de alma", disse Monk para a Uncut.

"Björk tem um código de ética rigoroso quando trabalha", diz Anohni, outra colaboradora. "Mesmo durante a quarentena. Ela é implacável em sua busca para evoluir, para refinar suas maneiras de se expressar, e é por isso que ela continua sendo uma artista de ponta. Ela ferve uma curiosidade meticulosa pelo mundo ao nosso redor, que está em constante evolução e mudança. Ela é generosa, de coração aberto, autoconfiante e disposta a assumir riscos. Eu sempre digo que trabalhar no estúdio com Björk é como um cachorro tentando acompanhar um cavalo. Às vezes, é até assustador. Ela pode improvisar infinitamente sem pular por diferentes gêneros. Não importa o que ela cante, é importante como ela canta - sempre em seu estilo de assinatura".

Björk refere-se a "Fossora" como seu "álbum de cogumelos", algo "pesado e com o pé no chão". Esta é a parte final de uma trilogia que começou com o disco que ela lançou em 2015: "O "Vulnicura" foi de partir o coração, comigo me afogando em lava, nua, chorando e sentindo pena de mim mesma", explica a islandesa. Cordas penetrantes, beats rebeldes e letras autoincriminatórias parecem extremamente contrastantes no pano de fundo de "Utopia", lançado em 2017. "O "Utopia" era uma cidade nas nuvens. Tudo estava imerso no idealismo da ciência popular. Eu estava absolutamente firme em minha intenção de criar tal fantasia.

Eu acho que sempre temos que começar com um manifesto depois de um desastre. Então com "Fossora" foi tipo: "Vamos ver se todas essas regras realmente funcionam? Vamos descer da cidade utópica flutuando no céu e pousar no chão". Eu só queria pousar no planeta Terra e enterrar meus pés no solo. Então, depois de todas as flautas de "Utopia", a primeira coisa que fiz foi pegar seis clarones".

Na terra islandesa que inspirou Björk a novas conquistas criativas, a mãe da artista, que morreu em 2018, também foi representada no novo disco. As músicas "Sorrowful Soil" e "Ancestress" foram escritas em meio ao luto. "Pensei em lançá-las separadamente em homenagem a ela. Mantive essa opção na cabeça até o fim, mas no final decidi incluí-las no álbum. Passei mil anos tentando descobrir como chamar o disco. "Fossora" - aquela que cava. Isso se estende ao funeral e às emoções de perder um dos pais. Acho que a maioria das pessoas tem um relacionamento difícil com os pais. Não vou fingir que o nosso era perfeito. Tenho uma relação bastante simples com meus filhos, parentes e amigos. Eu tive muita sorte. Mas meu relacionamento com minha mãe sempre foi uma exceção. Talvez nossas personalidades realmente não combinassem? Talvez seja porque... A gente se torna o oposto dos pais, como yin e yang. A gente se transforma em algo que nossos pais não são, para equilibrar... Posso falar sobre o meu relacionamento com minha mãe por cinco semanas seguidas”, ela ri. "Conversei com meu amigo (poeta) Ocean Vuong, cuja mãe também faleceu recentemente. Durante as idas às livrarias, notei que um terço dos livros é dedicado ao relacionamento com os pais. Que diabo é isso? Por que ninguém me ensinou isso antes?".

Björk sempre organizou música para funerais familiares, mas sendo uma ateia convicta, sempre se manteve longe das igrejas. "Eu não aguento tudo aquilo", ela admite, "para mim, é tão inapropriado, toda aquela ação. E eu não sei o motivo. Talvez porque meu negócio seja escrever e tocar músicas? E eu olho para tudo isso da minha torre do sino?", ela argumenta. "Chego em casa e penso: "Espera aí! A cerimônia não foi nada. Os músicos tocaram terrivelmente. O serviço fúnebre foi longo, poderia ter sido encurtado. Afinal, o que o padre estava murmurando? Ele nunca a conheceu! É tudo bobagem!"".

Juntamente com o irmão, Björk organizou um velório para a mãe: "Eu não queria chamar de funeral!" — mas desta vez ela ficou na igreja. "Tendo evitado tais eventos por 30 anos, fui crítica. Meu subconsciente ficou tenso e saiu com "Ancestress", ela diz. A letra pode parecer primitiva, mas cada palavra nasceu com certo peso, porque ela queria que tudo tivesse o tom certo. Não muito triste, mas também não muito feliz. Sem sensações ou melodramas. Apenas seriedade equilibrada.

Em "Ancestress", Björk é acompanhada por seu filho Sindri, enquanto sua filha Isadora canta na faixa de encerramento do álbum, "Her Mother's House", com reflexões sobre sua própria maternidade: "Tentei rir do meu eu pegajoso e desajeitado", ela ri. "Quando as crianças crescem e nos deixam, a gente tem que encontrar coragem para dizer adeus a elas com dignidade. Mas agora cinco anos se passaram, e ainda estamos nos despedindo, e elas continuam voltando para nós pedindo ajuda... Então, quando convidei minha filha para participar da gravação, tentei rir de mim mesma. É a minha maneira de dizer: "Desculpe, estou fazendo o meu melhor". Quando estamos muito fixados em uma área da nossa vida, não estamos focando em outras, então não teremos sucesso!".

O matriarcado de "Fossora" é ainda reforçado pela participação da cantora norueguesa Emilie Nicolas, que deu voz à composição "Allow". Após receber a faixa por e-mail e estudar a letra, a artista gravou seu verso em plena gravidez. "Emilie era um elemento importante das discotecas da minha casa. Quando terminávamos, a gente sempre tocava a música de Emilie antes de ir para a cama. Ela é a nossa queridinha norueguesa! A voz dela é simplesmente incrível, ela nunca "grita" para nós. Quando ouvimos os vocais dela em fones de ouvido, percebemos tantos tons diferentes! E não é ostensivo, mas muito autêntico. Ela me lembra Liz Fraser nesse sentido".

Como uma fã de Björk que ouvia "Army Of Me" todos os dias depois da escola, Emilie ficou surpresa com a oportunidade de cantar com seu ídolo. "Eu derramo lágrimas até agora pensando nisso. Björk me convidou para encontrá-la nos bastidores do show dela em Oslo e eu chorei por uma semana. Parecia tão ilusório [isso acontecer]! Quando ela me pediu para cantar com ela, a última coisa que eu queria fazer era copiá-la. Resolvi fazer as coisas do meu jeito, do meu próprio jeito! E essa é a coisa mais difícil em que já trabalhei! Entender os desejos dela e sentir a música é muito difícil quando não se está no mesmo lugar que a pessoa. Mas quando ela me enviou a música finalizada em que cantamos juntas, foi demais. Eu pensei comigo mesma: "Bom, ok, você pode morrer amanhã. Você fez tudo!".

Se "Fossora" é a terceira parte da "divina comédia" de Björk, então essa é sua versão pagã, terminando não com uma ascensão feliz, mas com um mergulho no solo vulcânico da Islândia. Após o inferno de "Vulnicura" e o ambiente celestial de "Utopia", nos encontramos nas extensões do solo instável de "Fossora", permeado por nossas raízes, laços familiares e ramificações românticas viscosas. 

Björk chama as capas de seus álbuns de "cartas de tarô", que personificam o som das canções. Muitas vezes, ela comentou que entre suas primeiras inspirações para compor estão os escritores islandeses Halldor Laxness e Thorbergur Thordarson, cujas carreiras emocionantes atingiram o pico da criatividade na casa dos sessenta: "Se você quiser documentar cada parte de si mesmo em detalhes e descobrir que aos 65 anos ainda tem pólvora em seus frascos, precisa voar por todo o sistema solar”, ela disse em entrevista ao Reykjavík Grapevine, em 2015. 

O diretor do selo "Iceland Music", Siggi Baldursson, esteve nas origens dessa história. Na adolescência, fundou a banda de pós-punk Þeyr e mais tarde se tornou membro do The Sugarcubes. "Me lembro de ouvir o ensaio do Tappi Tíkarrass no auditório da escola, em 1981. Björk tinha apenas 16 anos, mas mesmo durante a passagem de som ela conseguiu fazer uma performance significativa. Ela tem tanto poder desenfreado! Quando você a vê pela primeira vez no palco, ela te pega de surpresa, você não pode esquecer disso. Mesmo se trabalham juntos há anos!".

Ele também assistiu o Sugarcubes decolar no palco: "Fiquei muito surpreso que "Birthday" se tornou um sucesso. A música parecia surgir do nada, completamente finalizada. Trabalhamos em um estranho looping, então Björk começou a cantarolar a melodia e a música nasceu. Foi como se ela saltasse do nevoeiro - foi mágico! Mas não achei que seria um sucesso. Nós éramos punks e não pensávamos assim".

A separação do grupo era mais óbvia: "Ficamos todos muito pressionados! Antes a gente administrava nossa pequena gravadora na Islândia, e quando assinamos com a Elektra nos Estados Unidos, de repente esperavam que fizéssemos muitas coisas. Não estávamos nada felizes em ter que agendar sessões de autógrafos nas lojas e fazer promoções de rádio. Também tivemos que fazer turnês exaustivas, o que afetou a voz de Björk".

O trabalho coletivo do grupo claramente interferiu no desenvolvimento solo de Björk: "Era impossível levar músicas prontas para os ensaios. Era possível trazer ideias, que depois finalizávamos juntos, moldadas como esculturas de barro. Mas ficou óbvio para nós que Björk precisava de um canal diferente para se realizar. Eu me lembro dela trazendo uma versão inicial de "Human Behavior" para o ensaio, que não combinava muito com o estilo The Sugarcubes".

Essa qualidade, ele insiste, progrediu cada vez mais à medida que a carreira dela avançava. "Adoro vê-la explorar constantemente novos horizontes e experimentar. Este é o principal significado das aulas de música para ela: a oportunidade de aprender sobre o mundo ao seu redor. Ninguém dominou as extensões do universo musical assim: do "big bang" de "Cosmogony" em "Biophilia", aos buracos negros de "Vulnicura". Através do primeiro amor e das sensações grandiosas de "Big Time Sensuality"; por meio de canções sobre nascimento, maternidade e morte - ninguém fez isso com a coragem e determinação que Björk mostra. Quem mais pode organizar/reunir um público de compositores clássicos, hardcores de rave, fãs de pop, amantes da música medieval, artistas e compositores de vanguarda ao seu redor? Quase sem ajuda externa, Björk manteve uma abordagem modernista da criatividade, trazendo à música para o maior público possível com as ideias mais "estranhas", muitas das quais não estariam nas rádios hoje".

40 anos depois, Siggi ainda vê esse espírito adolescente em Björk. "Eu a vi se apresentar no outono passado, quando ela deu uma série de shows no Harpa Hall em Reykjavík. Assisti ao espetáculo com o coral Hamrahlíð fundado por Thorgerdur Ingolfsdottir em 1982. Foi puro fogo! Havia apenas Björk, um coral e alguns aparelhos eletrônicos. Foi incrível!".

Em 2019, após a morte de sua mãe, Björk se tornou avó pela primeira vez. Ela encarou isso com seu entusiasmo típico. Ela diz que mal pode esperar para compartilhar seus interesses com o pequeno, incluindo histórias sobre cogumelos. "Há um ótimo documentário na Netflix chamado "Fungos Fantásticos". Os melhores especialistas em cogumelos são iniciantes, porque tudo isso se tornou uma ciência há relativamente pouco tempo. Eles estudam como os cogumelos transmitem informações de árvore para árvore, sendo o sistema nervoso da floresta. Meu quarto está cheio de livros sobre cogumelos! Merlin Sheldrake, "Sweet Grass Weaving" de Robin Wall Kimmerer. Ela tem uma voz muito suave e calma. Eu escuto todos os dias (o audiolivro) antes de ir para a cama!".

E o neto de Björk gosta de cogumelos? "Eu fui caçar cogumelos pela primeira vez na minha vida há dois anos, no meio da gravação de um novo álbum. Costumávamos fazer isso na Islândia, mas nos últimos 100 anos, de alguma forma paramos. E agora, quando nossa geração está produzindo ativamente todos os tipos de livros e instruções, estamos retomando o hábito! Vou caçar cogumelos com meu neto! O meu plano astuto é o seguinte: se eu aprender isso agora, mais tarde ele vai pensar que a vovó sempre foi tão sábia e sabia quais cogumelos colher", ela ri. 💓

As aventuras emocionantes de Björk, todos os lugares que ela visitou e todas as pessoas que conheceu a transformaram em um guia ideal para os cantos inexplorados da natureza humana, nosso planeta e o universo. Hoje, a artista investiga admiráveis ​​mundos novos, descobrindo novos talentos e inspirando jovens artistas.

"Ela tem sido um ícone na Islândia", diz Siggi, "provavelmente porque sua arte não é tão fácil de enquadrar. Ela tem sua própria visão criativa e única. Ela está sempre à frente do resto. Acho que essas qualidades são óbvias não apenas para os amantes da música, mas também para as pessoas comuns. Ela tem o status de uma lenda".

"A curiosidade dela não tem limites!", explica Meredith Monk. "Tenho muito respeito por seu espírito criativo! A música lhe deu muitos dons que ela conseguiu passar para as próximas gerações. É a melhor coisa que você pode fazer como artista".

Björk planeja ser uma matriarca honrada? A rainha mãe da música pop de vanguarda, criando aos 70 e 80 anos? "A gente nunca sabe com antecedência!", ela responde antes de ir até a próxima reunião de negócios. Muito em breve, seu estilo de vida rural e quieto dos últimos dois anos, irá de encontro ao peso de uma máquina durante a divulgação de "Fossora": "Mas se a fama é tudo pelo que você trabalha, então você provavelmente está louco! É como lavrar durante 50 anos por um relógio de ouro por um longo tempo! Afinal, fazemos isso por amor ao nosso "chamado", e não pelo relógio".

Como é trabalhar com Björk?

Peter Strickland, diretor: "Gostei muito de trabalhar com Björk, lembro dessa época com carinho. Ela definitivamente tem sua própria visão clara: uma vez que seus desejos são expressos, a gente ganha espaço para improvisação. Ela, é claro, fez edições, mas havia menos do que a de um patrocinador de um filme comum da Grã-Bretanha. O filme-concerto "Biophilia" é uma ideia pessoal dela, e nós apenas contribuímos para a realização disso".

Anohni, cantora e compositora: "Eu cantei em três de suas músicas, "The Dull Flame Of Desire", "My Juvenile" e "Atom Dance", e para o meu álbum "Swanlights" nós escrevemos e tocamos "Flétta" juntas. Minha primeira lembrança clara de Björk é estar sentada em uma colina perto de sua casa de verão em meio a um frenesi de fã, e ela me convenceu sensivelmente a começar a cuidar de mim mesma. Ela tem uma abordagem espartana para cantar sobre isso que é absolutamente hipnotizante, especialmente acompanhando de perto".

Emilie Nicolas, cantora e compositora: "Acho que Björk é uma cantora de jazz, embora não precise de limites de gênero musical. Pessoalmente, me sinto como uma musicista de jazz quando escrevo canções. Eu improviso e uso todos os elementos da composição. Meu horizonte musical se expandiu dramaticamente quando estudei jazz. E acho que Björk tem os superpoderes de uma artista de jazz. Com base no que você já ouviu, você cria algo novo, inédito, nunca visto antes. Eu nem sei como descrever o jazz, mas é uma boa definição!".

Meredith Monk, compositora, performer, diretora, vocalista, cineasta, e coreógrafa: "Nos conhecemos em um programa de rádio com a pianista e apresentadora Sarah Cahill para participar de uma série de programas sobre músicos pop e compositores de vanguarda. Björk e eu fomos as primeiras. Tivemos uma entrevista maravilhosa, após a qual ambas derramamos lágrimas. Nós parecemos ter tanta coisa em comum! Mais tarde, começamos a trabalhar em uma série de duetos que nunca conseguimos concluir devido às agendas lotadas. Meu sonho é visitar a Islândia e trabalhar neles com Björk".

Fotos: Vidar Logi, Santiago Felipe.

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